Por Rev. Misael Nascimento
Um cristão protestante pode participar de festas juninas? Três
respostas têm sido dadas a esta pergunta. Primeiro, há os que dizem “sim”, uma
vez que entendem as festas juninas como celebrações cristãs. Afirma-se, nesse
caso, que estamos diante de festejos ligados a personagens bíblicos tais como
João Batista, Pedro e Paulo e isso, por si só, legitima tais festas como
integrantes do calendário cristão. Essa é a posição defendida pela Igreja
Católica Apostólica Romana (ICAR).
Outros
respondem com um absoluto “não”. Entendem que o modo como o Catolicismo Romano
ensina sobre os santos não é bíblico. A Bíblia não prescreve nenhuma festa
ligada aos profetas ou apóstolos, muito menos a nenhum ser humano canonizado
pela igreja. Não há espaço para a crença em santos mediadores. Segundo as
Escrituras “há um só mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus, homem” (1Tm
2.5). Essa é a posição defendida pela maioria dos evangélicos
tradicionais.
Uma terceira
resposta inicia com um “não”, afirmando que os cristãos protestantes devem
afastar-se das comemorações romanistas das festas juninas e, ao mesmo tempo,
finaliza com um “sim”, abrindo espaço para a realização de arraiais
gospel – festas caipiras evangélicas. Essa posição tem sido defendida por
alguns evangélicos.
Aqui é
recomendável lembrar as palavras do apóstolo Paulo:
Portanto, meus amados, fugi da idolatria. Falo como a criteriosos; julgai vós mesmos o que digo. Porventura, o cálice da bênção que abençoamos não é a comunhão do corpo de Cristo? Porque nós, embora muitos, somos unicamente um pão, um só corpo. Considerai o Israel segundo a carne; não é certo que aqueles que se alimentam dos sacrifícios são participantes do altar? Que digo, pois? Que o sacrificado ao ídolo é alguma coisa? Ou que o próprio ídolo tem algum valor? Antes, digo que as coisas que eles sacrificam, é a demônios que as sacrificam e não a Deus; e eu não quero que vos torneis associados aos demônios. Não podeis beber o cálice do Senhor e o cálice dos demônios; não podeis ser participantes da mesa do Senhor e da mesa dos demônios. Ou provocaremos zelos no Senhor? Somos, acaso, mais fortes do que ele? (1Co 10.14-22).
Um dos fatos a
destacar é que, no texto em questão, Paulo trata da participação dos cristãos em
refeições realizadas no contexto de rituais pagãos (Bíblia de Estudo de
Genebra, 1. ed., 1999, nota 10.14, p. 1357). Sua convicção é que o cristão
não deve participar de coisas ligadas à idolatria; tal ligação, em última
instância, corresponde a uma “associação” com os demônios. Para o apóstolo, o
problema era que os crentes, ao comer alimentos oferecidos aos ídolos,
depreciavam sua comunhão com Deus na Santa Ceia, ou seja, agiam de modo
inconsistente com a aliança, e, deste modo, provocavam o “zelo” do Senhor (1Co
10.18-22).
Isso pode ser
transposto à questão das festas juninas por meio de um argumento de quatro
pontos, qual seja:
- A veneração aos santos da ICAR, por ferir não apenas a recomendação de 1Timóteo 2.5, mas também Êxodo 20.3-6, é idolatria.
- As festas juninas, ligadas à veneração dos santos romanistas, são idólatras.
- O cristão, de acordo com 2Coríntios 10.14, deve fugir da idolatria.
- Portanto, o cristão deve fugir das festas juninas.
Anteriormente
eu entendia que não havia problema em uma criança participar dos festejos
juninos de sua escola. Hoje penso que o melhor é os pais explicarem a essa
criança as razões pelas quais ela não participará da festa junina. É mais
instrutivo, bíblico e edificante.
Mas, o que
dizer da “alma caipira” que reside em nós, que nos motiva a acender fogueira,
assar mandioca e batata-doce e comer bolo de fubá? Qual o problema, por exemplo,
de realizar uma noite caipira ao som de modas de viola e, quem sabe, até brincar
inocentemente de quadrilha evangélica? Ou criar uma “Festa dos Estados”,
com barracas de comidas típicas ou algo semelhante, quem sabe até como
estratégia para atrair visitantes?
Inicialmente,
declaro meu respeito aos colegas pastores e irmãos em Cristo que não enxergam
problemas na realização desse tipo de atividade. Eu mesmo já acreditei que isso
podia ser feito sem prejuízos para o testemunho cristão e fiz isso de muito boa
fé, com a alma sincera diante de Deus. No entanto, mudei de posição. Hoje, creio
que a produção de versões evangélicas de festas juninas não é
recomendável por algumas razões. Primeiro, porque estamos saturados de versões
gospel de tudo: Temos uma quase inesgotável lista de práticas e
“produtos” gospel. É preciso compreender que não fomos chamados a imitar
o mundo e sim a transformá-lo (1Jo 2.15-17).
Em segundo
lugar, há outro problema denominado associação. É possível que, ao
participar de uma festa junina gospel, sejam feitas associações com o
evento original, de origem e significado idolátricos – queiramos ou não, festas
juninas estão ligadas às crenças da ICAR. Cristãos sensíveis podem sentir um
desconforto inexplicável diante disso. Visitantes interessados na fé protestante
exigirão explicações mais detalhadas sobre as razões da realização de tal noite
caipira “calvinista”.
Sendo assim,
parece-me mais adequado considerar as festas juninas evangélicas entre
aquelas coisas que o apóstolo Paulo chama de lícitas, mas inconvenientes e
não-edificantes (1Co 10.23). Nessas questão, pensemos primeiramente nos
interesses do corpo de Cristo, e não nos nossos (1Co 10.24). Não sou contra
comer bolo de milho, ou canjica, ou pé-de-moleque. Gosto de batata-doce assada
na brasa e me delicio com um bom curau e uma música caipira de raiz. Desfrutemos
dessas coisas, porém, na privacidade de nossos lares ou fora do contexto de
festas caipiras nos meses de junho e julho. Não porque tais iguarias sejam
pecaminosas em si, mas para evitar associações indesejáveis.
Somos livres
para participar de festas juninas? Não. Ao participarmos de tais festas, nos
ligamos em idolatria. Devemos realizar eventos caipiras gospel? Devemos
participar de tais atividades? Também não. Nesse segundo caso, não porque haja
idolatria envolvida, mas porque há o perigo de associações indesejáveis. O ideal
é que fortaleçamos nossa identidade cristã, bíblica e protestante,
desvinculando-nos de qualquer aparência do mal (1Ts 5.22).
Fonte: Misael Nascimento Via: Creio e Confesso
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